Posso fazer usucapião de uma área de preservação permanente (APP)?

Por Emerson Souza Gomes
Apesar das áreas de preservação permanente (APP) serem espaços territorialmente protegidos, via de regra não são áreas de domínio público e podem ser adquiridas por intermédio da usucapião.
O que é área de preservação permanente (APP)
Uma área de preservação permanente é um espaço territorial protegido localizado em zona urbana ou rural, coberto ou não por vegetação nativa, que desempenha importantes funções para o equilíbrio ecológico do meio ambiente.
Pela sua importância, as APP’s podem estar inseridas tanto em imóveis particulares, como também, de domínio público.
Bens públicos não são passíveis de usucapião
A Constituição é pontual ao afirmar que imóveis públicos não são passíveis de serem adquiridos pela usucapião.
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.
(omissis)
§ 3º Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.
Constituição Federal
Ao mesmo tempo, a Constituição elenca quais são os bens que integram o patrimônio da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Somente bens alienáveis podem ser objeto de usucapião
Dentre os requisitos para a usucapião de um bem móvel ou imóvel, é necessário que o bem seja passível de apropriação privada, não integrando as coisas fora do comércio, sendo assim possível a sua alienação, como na compra e venda.
Área de preservação permanente é passível de usucapião
Uma área de preservação permanente, inserida em imóvel de domínio público, não é passível de usucapião.
Por conseguinte, caso a APP esteja localizada em imóvel de propriedade privada – não integrando o patrimônio de uma das pessoas políticas (União, Estados, Municípios e Distrito Federal) – não há qualquer obstáculo para que a APP seja adquirida por intermédio da usucapião, podendo o particular inclusive realizar obras de baixo impacto ambiental, como na construção de pequeno ancoradouro.

Neste sentido, inclusive, têm sido a manifestação dos Tribunais, reafirmando a possibilidade da aquisição de APP por meio da ação de usucapião.
Usucapião: aquisição originária da propriedade
A usucapião é uma forma de aquisição originária da propriedade de um bem móvel ou imóvel, o que significa dizer que, por ser “originária”, deixam de existir quaisquer outros vícios ou impedimentos na transmissão da propriedade observados antes da aquisição do bem pelo posseiro, passando este a ser o primeiro proprietário da coisa frente a quaisquer pessoas e em quaisquer circunstâncias.
Base legal
Constituição Federal da República

Jurisprudência: usucapião de área de preservação permanente
A eventual caracterização do imóvel, ou parte dele, como área de preservação permanente não implica obstáculo legal ao seu assenhoramentopelo particular, podendo, então, ser objeto de usucapião. É que a qualificação de determinada área como sendo de preservação permanente não a insere, por si só, no domínio público.Há compatibilidade legal entre o domínio privado e a delimitação da área de preservação permanente; configura-se,apenas,limitação administrativa à propriedade, estabelecida em prol do interesse coletivo de preservação ecológica. (STF, RE n. 605658/ RS, Relator, Min. Carmen Lúcia, Data de Julgamento: 01/02/2010 – grifou-se).
APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. GLEBA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. IRRELEVÂNCIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Ainda que o imóvel em questão se situe, efetivamente, em Área de Preservação Permanente, tal fato não representaria óbice à aquisição de sua propriedade por meio da usucapião. “A posse mansa, pacífica e ininterrupta por prazo superior a 20 anos é hábil à declaração do domínio, nos termos do art. 550 do Código Civil de 1916. O fato de se tratar de área de preservação permanente não é óbice à consumação da usucapião extraordinária, cabendo aos entes públicos, na competência que lhes é conferida pelo art. 23 da Constituição Federal, exercitar seu poder de polícia com vistas à proteção e à fiscalização da área de proteção ambiental, ainda que ocupada por particular” (Ap. Cív.n. 2004.021629-7, de Imbituba, rel. Des. Jaime Ramos, j. 5-10-2004). (TJSC,Apelação Cível n. 2012.062591-9, de Criciúma, rel. Des. Júlio César Knoll,Quarta Câmara de Direito Público, j. 06-06-2013)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. ALEGADA POSSE ININTERRUPTA, SEM OPOSIÇÃO, COM ANIMUS DOMINI E POR MAIS DEQUINZE ANOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. AGRAVO RETIDO.INEXISTÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO PARA QUE SEJA JULGADO EMCONJUNTO COM O APELO. NÃO CONHECIMENTO. RECURSO DO RÉU. DESRESPEITO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE ALEGADO EM CONTRARRAZÕES. INSURGÊNCIA RECURSAL QUE IMPUGNOU ESPECIFICAMENTE A DECISÃO OBJURGADA. VIOLAÇÃO INEXISTENTE.MÉRITO. ALEGADA MÁ VALORAÇÃO DA PROVA ORAL COLHIDA. EXERCÍCIO DA POSSE QUE TERIA SIDO AFASTADO PELAS TESTEMUNHAS. INSUBSISTÊNCIA. (…)TERRENO INSERIDO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. IRRELEVÂNCIA AO RECONHECIMENTO DA AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE. APURAÇÃO DE INFRAÇÕES AMBIENTAIS NÃO OBSTADA PELA POSSE DE PARTICULAR. MAS QUE DEVEM SER OBJETO DE AÇÃO PRÓPRIA. REQUISITOS DO ART. 1.238 DO CÓDIGO CIVIL PREENCHIDOS. PREQUESTIONAMENTO DESNECESSÁRIO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0002184-47.2009.8.24.0008, de Blumenau, rel. Des. André Luiz Dacol, SextaCâmara de Direito Civil, j. 24-04-2018).
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