Sociedade de contadores deve recolher ISS sobre valor fixo, decide TJSC

Sociedade de contadores, sem caráter empresarial, deve recolher ISS sobre valor fixo, decide TJSC.

Sociedade de contadores, sem caráter empresarial, deve recolher ISS sobre valor fixo, decide TJSC.

De acordo com o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), ainda que haja pagamento de pró-labore, a pessoa jurídica constituída como sociedade simples pura, com responsabilidade técnica dos sócios pela execução dos serviços, tem direito líquido e certo ao recolhimento do ISS sob a sistemática de valor fixo.

A decisão data de 15 de dezembro de 2000 e foi exarada em sede de apelação que confirmou sentença da Comarca reconhecendo o direito de sociedade de contadores a recolher ISS por valor fixo.

Fonte: TJSC

Segue abaixo íntegra da decisão.

Jurisprudência

ÍNTEGRA DA DECISÃO

ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Apelação / Remessa Necessária n. 0301144-31.2019.8.24.0064

Apelação / Remessa Necessária n. 0301144-31.2019.8.24.0064, de São José

Relator: Desembargador Carlos Adilson Silva

APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ISS. SOCIEDADE DE CONTADORES.

PLEITO DE RECOLHIMENTO DO TRIBUTO SOB A SISTEMÁTICA DE VALOR FIXO. EXISTÊNCIA DE PREVISÃO ESPECÍFICA NO ART. 7º DA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N. 36/2009 SOBRE O REGIME DE TRIBUTAÇÃO FIXA EM RELAÇÃO ÀS SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS QUE PRESTAM SERVIÇOS DE CONTABILIDADE E SÃO OPTANTES DO SIMPLES NACIONAL. TODAVIA, ADESÃO AO SIMPLES NACIONAL QUE NÃO ENSEJA, POR SI SÓ, O DIREITO À TRIBUTAÇÃO DO ISS EM VALOR FIXO. BENEFÍCIO RESTRITO ÀS SOCIEDADES SEM CARÁTER EMPRESARIAL, INDEPENDENTEMENTE DA FORMA DE SUA CONSTITUIÇÃO, CONFORME ENTENDIMENTO RECENTEMENTE ASSENTADO PELO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO. IMPETRANTE CONSTITUÍDA COMO SOCIEDADE SIMPLES PURA. CONTRATO SOCIAL INDICATIVO DE QUE AS ATIVIDADES SÃO DESENVOLVIDAS PELOS SÓCIOS DE MANEIRA VINCULADA À QUALIFICAÇÃO TÉCNICA E INTELECTUAL QUE POSSUEM, E NÃO EM CARÁTER EMPRESARIAL.

Na esteira da jurisprudência desta Corte, apesar da possibilidade, em tese, de recolhimento do ISS pela alíquota fixa, conforme previsto no art. 7º da Lei Complementar n. 36/2009, do Município de São José, não revogada tacitamente pela Lei Complementar Federal n. 157/2016, ainda é preciso verificar se os serviços contábeis são ou não prestados em caráter pessoal, em detrimento do seu caráter empresarial.

Se o contrato social juntado aos autos, apesar de prever o pagamento de pró-labore, o que poderia indicar um traço empresarial, evidencia que a pessoa jurídica foi constituída como sociedade sociedade simples pura, com responsabilidade técnica dos sócios pela execução dos serviços, há direito líquido e certo ao recolhimento do ISS sob a sistemática de valor fixo.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

DEMAIS TERMOS DA SENTENÇA CONFIRMADOS EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação / Remessa Necessária n. 0301144-31.2019.8.24.0064, da comarca de São José (Vara da Fazenda Pública) em que é Apelante Município de São José e Apelado Sergecon Serviços Gerais de Contabilidade S/s.

A Segunda Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, confirmando os demais termos da sentença em sede de reexame necessário. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 15 de dezembro de 2020, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Francisco Oliveira Neto, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Sérgio Roberto Baasch Luz.

Florianópolis, 16 de dezembro de 2020.

Desembargador Carlos Adilson Silva

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta pelo Município de São José contra sentença proferida pela MMa. Juíza de Direito da Vara da Fazenda Pública da Comarca de São José, Dra. Taynara Goessel, que, em mandado de segurança impetrado por (omitimos o nome) contra ato coator supostamente praticado pela Secretário de Receita de São José, concedeu a ordem pleiteada na inicial para declarar o direito de recolher o ISS sob a sistemática de valor fixo prevista no art. 9º, § § 1º e 3º, do Decreto-Lei n. 406/68 e no art. 18, § 22-A, da Lei Complementar n. 123/06, bem como determinar que a autoridade coatora libere a emissão das guias do ISS-fixo, cujo pagamento deve ser feito com os valores depositados nos autos pela parte impetrante.

Em suas razões recursais, o apelante sustenta que: a) a apelada não comprovou que os serviços realizados por ela são prestados de forma pessoal, nos termos do art. 9º, § 3º, do Decreto-Lei n. 406/1968, assumindo, em verdade, feição empresarial; b) a legislação federal (Decreto Lei n. 406/68) oferece ao Fisco Municipal a opção de adotar a alíquota fixa ou variável para recolhimento do ISS, cabendo à legislação municipal prever a forma para o seu recolhimento, o que, no caso do município de São José, encontrava-se regulado nos arts. 267 e 268 do Código Tributário Municipal até o advento da Lei Complementar n. 80/2017, quando referidos dispositivos foram expressamente revogados; c) a tentativa da sociedade recorrida em permanecer fruindo do regime do recolhimento do ISS na modalidade de valor fixo ofende a vedação de aplicação de uma alíquota inferior à 2% determinada no art. 8º-A da Lei Complementar n. 116/2003; e d) embora a Lei Complementar n. 123/2006, que trata do Simples Nacional, disponha em seu art. 18, § 22-A, que é devida a aplicação do ISS com alíquota fixa para a atividade de escritórios de serviços contábeis, este dispositivo não é auto-aplicável, fazendo-se necessária a edição das competentes leis municipais.

Apresentadas as contrarrazões (fls. 280-293), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça, sendo posteriormente redistribuídos a este Relator.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Ricardo da Silva, opinando “(…) pelo conhecimento e provimento do apelo interposto pelo Município de São José, bem como da remessa necessária, para que seja integralmente reformada a sentença recorrida a fim de denegar a ordem postulada, diante da inexistência do alegado direito líquido e certo” (fls. 312-322).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso deve ser conhecido, porquanto satisfeitos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

Sabe-se que opção da impetrante, sociedade de serviços contáveis, pelo Simples Nacional não enseja, por si só, o direito à tributação do ISS em valor fixo:

“TRIBUTÁRIO. ISS. SOCIEDADE DE SERVIÇOS CONTÁBEIS. ADESÃO AO SIMPLES NACIONAL. TRIBUTAÇÃO POR VALOR FIXO. ATIVIDADE EXERCIDA COM CARÁTER EMPRESARIAL (SOCIEDADE DE RESPONSABILIDADE LIMITADA). IMPOSSIBILIDADE.

1. A tese apresentada pela recorrente é de que, por ser optante do Simples Nacional, possui direito ao recolhimento do ISS com base em valor fixo, diante do disposto no art. 18, §§ 22-A e 5ºB, alínea XIV.

2. O Tribunal de origem, para solucionar a lide, consignou que o regime instituído pela LC 123/2006 não revogou a regulação do tema pelo Decreto-Lei 406/1968 e que a Constituição Federal de 1988 e o art. 1º da LC 116/2003 asseguram a competência tributária do ente municipal para fiscalizar e arrecadar o ISS. No mérito, concluiu, com base nas premissas acima e com base na prova dos autos (leitura dos atos constitutivos), que a recorrente não se enquadra no conceito de sociedade uniprofissional, mas assumiu a forma empresarial de sociedade de responsabilidade limitada, de modo que não teria direito ao recolhimento da exação por valor fixo.

3. Segundo o art. 18, § 22-A, da Lei Complementar 123/2006, a atividade prestada pelos escritórios de serviços contábeis está sujeita “ao recolhimento do ISS em valor fixo, na forma da legislação municipal”.

4. A afirmação da recorrente – de que a LC 123/2006 é hierarquicamente superior à legislação municipal – não se sustenta, na medida em que a norma acima referida expressamente afirma que o recolhimento da exação por valor fixo será disciplinado conforme a legislação do ente que possui competência para instituir e cobrar o ISS.

5. Não se extrai, porém, do texto normativo acima, a exegese segundo a qual as sociedades prestadoras de serviço que assumam forma empresarial também estão sujeitas ao recolhimento do ISS por valor fixo, pelo simples fato de terem aderido ao Simples Nacional.

6. Qualquer interpretação no sentido de que a Lei Complementar 123/2006 revogou integralmente a legislação de todos os entes municipais seria de duvidosa constitucionalidade, uma vez que o Simples Nacional constitui mero regime diferenciado de arrecadação, cobrança e fiscalização, destinado a desburocratizar a tributação das microempresas e empresas de pequeno porte, e não de instrumento que autoriza a União a se sobrepor à competência tributária e legislativa dos Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, mas isso é questão a ser apreciada na via recursal adequada (a recorrente interpôs Recurso Extraordinário).

7. Nessa ordem de ideias, é de fundamental importância registrar que a recorrente, segundo as premissas fixadas pelo acórdão hostilizado, não é sociedade uniprofissional, mas sim assumiu a forma de empresa de responsabilidade limitada, razão pela qual não prospera a tese por ela defendida.

8. Recurso Especial não provido.” (STJ, REsp 1.729.218/SP, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 3-5-2018)

Por sua vez, na esteira da jurisprudência desta Corte, apesar da possibilidade, em tese, de recolhimento do ISS pela alíquota fixa, de acordo com a Lei Complementar Municipal n. 36/2009, não revogada tacitamente pela Lei Complementar Federal n. 157/2016, ainda é preciso verificar se os serviços contábeis são ou não prestados em caráter pessoal, em detrimento do seu caráter empresarial.

Confira-se:

“TRIBUTÁRIO. ISS. EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS DE CONTABILIDADE OPTANTE DO SIMPLES NACIONAL. POSSIBILIDADE, EM PRINCÍPIO, DE RECOLHIMENTO DO IMPOSTO PELA ALÍQUOTA FIXA, EM CONFORMIDADE COM O PREVISTO NA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N. 36/2009. NORMATIVA NÃO REVOGADA TACITAMENTE PELA LEI COMPLEMENTAR FEDERAL N. 157/2016. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO, ENTRETANTO, DA EXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE PESSOAL DOS PROFISSIONAIS. SOCIEDADE CONSTITUÍDA SOB A FORMA LIMITADA A DENOTAR SEU CARÁTER EMPRESARIAL. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.” (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 0301128-14.2018.8.24.0064, de São José, rel. Des. Ronei Danielli, Terceira Câmara de Direito Público, j. 5-5-2020) [grifou-se]

“TRIBUTÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. ISS. MICROEMPRESA COM O OBJETO SOCIAL DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE CONTABILIDADE, ENQUADRADA NO SISTEMA DO SIMPLES NACIONAL. PRETENSÃO DE RECOLHIMENTO DO TRIBUTO SOB A FORMA DE VALOR FIXO, EM CONFORMIDADE COM O ART. 9o, § 1o, DO DECRETO-LEI N. 406/1968 E COM O ART. 18, § 22-A, DA LEI COMPLEMENTAR N. 123/2006. INDEFERIMENTO PELO FISCO MUNICIPAL, SOB O FUNDAMENTO DE QUE A SISTEMÁTICA DE TRIBUTAÇÃO DIFERENCIADA CONFIGURA BENEFÍCIO FISCAL, VEDADA PELO ART. 8º-A DA LEI COMPLEMENTAR N. 116/2003, INTRODUZIDO PELA LEI COMPLEMENTAR N. 157/2016. INSUBSISTÊNCIA. EXISTÊNCIA DE LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA MUNICIPAL, QUAL SEJA, O ART. 7o DA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N. 36/2009, QUE TRATA DO REGIME DE TRIBUTAÇÃO FIXA EM RELAÇÃO ÀS SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS QUE PRESTAM SERVIÇOS DE CONTABILIDADE E SÃO OPTANTES DO SIMPLES NACIONAL. APARENTE CARÁTER EMPRESARIAL DA IMPETRANTE, CONTUDO, QUE IMPEDE A CONCESSÃO DA SEGURANÇA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO DEMONSTRADO. REFORMA DA SENTENÇA.

Conforme o entendimento sedimentado do Superior Tribunal de Justiça, a sociedade de profissionais legalmente regulamentados, ainda que constituída sob a forma de responsabilidade limitada, pode ser submetida à tributação privilegiada de ISSQN estabelecida em valor fixo, nos termos art. 9º, § 3º, do Decreto-Lei n. 406/1968, desde que destituída de caráter empresarial. Acerca do assunto, destaco os seguintes precedentes: AgInt no REsp n. 1.417.214/RS, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 2/5/2017, DJe 16/6/2017; AgInt no AREsp n. 1.226.637/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 23/10/2018, DJe 7/11/2018; AgInt no REsp n. 1.400.942/RS, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 18/9/2018, DJe 22/10/2018. […]” (STJ, AgInt no REsp 1760627/RS, rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, j. em 06-06-2019, DJe 14-06-2019).

REMESSA E RECURSO CONHECIDOS E PROVIDOS.” (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 0301713-66.2018.8.24.0064, de São José, rela. Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 7-11-2019) [grifou-se]

A propósito, recentemente o Grupo de Câmaras de Direito Público apreciou o Incidente de Assunção de Competência n. 0301128-14.2018.8.24.0064, de relatoria do eminente Des. Ronei Danielli, fixando a seguinte tese: “As sociedades de profissionais liberais constituídas sob a forma de sociedade limitada fazem jus ao recolhimento do ISS em alíquota fixa, na forma do art. 9º, §§ 1º a 3º do Decreto-Lei n. 406/1968, sempre que estiver demonstrada, por qualquer meio de prova, a prestação de serviços em caráter pessoal, com responsabilidade específica e direta de cada sócio pelos serviços individualmente prestados”.

Extrai-se da ementa da decisão:

“INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. TRIBUTÁRIO. ISS. RECOLHIMENTO EM ALÍQUOTA FIXA. ART. 9º, §§ 1º E 3º, DO DECRETO-LEI N. 406/1968. SOCIEDADES UNIPROFISSIONAIS. CONSTITUIÇÃO SOB A FORMA DE SOCIEDADE LIMITADA. CIRCUNSTÂNCIA INAPTA, POR SI SÓ, PARA AFASTAR A SUBMISSÃO AO TRATAMENTO FISCAL ESPECÍFICO, COMO PRETENDIDO PELA FAZENDA MUNICIPAL. DEFINIÇÃO DA QUALIDADE DA SOCIEDADE QUE DEPENDE DO EXAME CONCRETO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS. REQUISITO DA LEI TRIBUTÁRIA AFETO À PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE NATUREZA INTELECTUAL EM CARÁTER PESSOAL PELOS PROFISSIONAIS LIBERAIS ASSOCIADOS.

Tese jurídica fixada: ‘As sociedades de profissionais liberais constituídas sob a forma de sociedade limitada fazem jus ao recolhimento do ISS em alíquota fixa, na forma do art. 9º, §§ 1º a 3º do Decreto-Lei n. 406/1968, sempre que estiver demonstrada, por qualquer meio de prova, a prestação de serviços em caráter pessoal, com responsabilidade específica e direta de cada sócio pelos serviços individualmente prestados.'” (TJSC, Incidente de Assunção de Competência n. 0301128-14.2018.8.24.0064, de São José, rel. Ronei Danielli, Grupo de Câmaras de Direito Público, j. 25-11-2020).

De acordo com as premissas fixadas no aludido IAC, a natureza das atividades desenvolvidas pela sociedade de profissionais liberais – atividade mercantil ou prestação pessoal de serviços sem caráter empresarial – não depende necessariamente da modalidade societária adotada (sociedade simples – S/S, sociedade simples limitada – S/S Ltda., ou sociedade limitada – Ltda.), e sim da circunstância de os serviços serem ou não prestados em caráter pessoal, com responsabilidade específica do prestador pelo trabalho individualmente desempenhado perante terceiros, o que afasta a qualificação do elemento de empresa, consistente na organização dos fatores de produção para exploração impessoal de determinada atividade econômica.

Ainda, constituindo-se como limitada, firmou-se a orientação no sentido de que há uma presunção legal em favor do Fisco acerca do caráter empresarial da sociedade, o que não garante o recolhimento do ISS por alíquotas fixas.

De acordo com o voto condutor:

“[…] Isso porque, dada a natureza mercantil e a previsão geral do art. 1.052 do Código Civil de limitação de responsabilidade dos sócios puramente com base no valor das quotas sociais, a adoção da sociedade limitada gera a presunção legal – inclusive em favor do Fisco – do caráter empresarial análogo às demais sociedades limitadas, às quais não é garantido o tratamento específico de alíquotas fixas para recolhimento do ISS.

Essa percepção abarca tanto as sociedades limitadas registradas perante a Junta Comercial quanto as sociedades simples limitadas (S/S Ltda.), registradas perante o Cartório do Registro Civil das Pessoas Jurídicas – afinal, a escolha dos constituintes pela adoção do regime da sociedade limitada conduz à incidência, em regra, da limitação de responsabilidade pelo valor das respectivas cotas, sem vinculação alguma perante os serviços individualmente prestados.

Diante disso, cabe ao contribuinte produzir prova em contrário na via administrativa ou judicial a fim de demonstrar que, embora constituída como sociedade limitada, os serviços que integram o seu objeto social são prestados em caráter pessoal com responsabilidade específica e individual de cada sócio.” [grifou-se]

Na espécie, a impetrante (omitimos o nome)foi constituída como sociedade simples pura – SS, e não sociedade limitada – Ltda., conforme evidencia o seu contrato social (fls. 14-19) e, apesar da existência de previsão de pagamento de pró-labore (cláusula 12), o que poderia indicar um traço empresarial, o contrato constitutivo também prevê que a responsabilidade técnica pela execução dos serviços é exercida pelos sócios (cláusula 13).

Ora, “(…) o simples fato de haver previsão do pagamento de pró-labore e eventual divisão desproporcional de lucros não é, por si só, suficiente para caracterizar a sociedade com empresarial” (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 5003313-42.2020.8.24.0064, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. em 24-11-2020).

Pela análise do contrato social, e não só pela tipo societário, tais circunstâncias conduzem à presunção de que as atividades são desenvolvidas pelos sócios de maneira vinculada à qualificação técnica e intelectual que possuem, e não em caráter empresarial.

Em hipótese similar ao caso dos autos, figurando como apelada igualmente (omitimos o nome), decidiu recentemente este Órgão Fracionário:

“REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. ISS. SERVIÇOS DE CONTABILIDADE. SOCIEDADE UNIPROFISSIONAL OPTANTE PELO SIMPLES NACIONAL. RECOLHIMENTO POR ALÍQUOTA FIXA. ALEGAÇÃO DE QUE O REGIME DIFERENCIADO DE TRIBUTAÇÃO CARACTERIZA BENEFÍCIO FISCAL VEDADO PELO ART. 8º-A, § 1º, DA LEI COMPLEMENTAR N. 116/2003 (ALTERAÇÃO PELA LEI COMPLEMENTAR FEDERAL N. 157/2016). PRETENSÃO FAZENDÁRIA DE IMPOR AO CONTRIBUINTE A ARRECADAÇÃO DO ISS COM ALÍQUOTA NÃO INFERIOR A 2%. LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA QUE TRATA DO REGIME DE TRIBUTAÇÃO FIXA EM RELAÇÃO ÀS SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS QUE PRESTAM SERVIÇOS DE CONTABILIDADE E SÃO OPTANTES DO SIMPLES NACIONAL. REGIME DIFERENCIADO. EXISTÊNCIA DE LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. SIMPLES MUNICIPAL REGULAMENTADO COM PREVISÃO ESPECÍFICA NO ART 7° DA LEI MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ N. 36/2009 QUE DISPÕE ACERCA DO RECOLHIMENTO DO ISS-FIXO, NOS MOLDES DA LEI FEDERAL. SENTENÇA MANTIDA. SEM HONORÁRIOS. ART. 25 DA LEI 12.016/09. REEXAME NECESSÁRIO E RECURSO DESPROVIDO.” (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 0301331-73.2018.8.24.0064, de São José, rel. Sérgio Roberto Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. 01-12-2020).

Por oportuno, extrai-se do inteiro teor do acórdão:

“[…] No caso em análise, extrai-se do contrato social juntado às fls. 21-26, que a pessoa jurídica foi constituída como sociedade sociedade simples com responsabilidade pessoal, o que pressupõe que suas atividades sejam desenvolvidas pelos sócios de maneira vinculada à qualificação técnica intelectual que possuem, o que de fato se deu no caso em tela vez que a autora é formada exclusivamente por contadores e técnicos em contabilidade, inscritos no Conselho Regional de Contabilidade, possuindo a qualificação para a prestação social do objeto social da pessoa jurídica.

Ademais, o Contrato Social foi registrado perante o Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de São José, estando de acordo com o que preceitua o art. 1.150 do Código Civil, segundo o qual: “O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária”, restando afastado o caráter empresarial da sociedade autora.

Ressalta-se, ainda, que não basta o Município de São José semear incertezas acerca da forma de desenvolvimento da atividade econômica da recorrida. Deveria este ter demonstrado nos autos, através de documentos aptos a desqualificar os já trazidos à inicial que demonstram o exercício da atividade de forma direta e pessoal.”

Assim, deve ser mantida a sentença que concedeu a ordem pleiteada na inicial para declarar o direito de recolher o ISS sob a sistemática de valor fixo, dada a existência de previsão específica no art. 7º da Lei Complementar Municipal n. 36/2009 sobre o regime de tributação fixa em relação às sociedades de profissionais que prestam serviços de contabilidade e são optantes do Simples Nacional.

Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento, confirmando os demais termos da sentença em sede de reexame necessário.

Custas isentas e honorários advocatícios incabíveis na hipótese (art. 25 da Lei n. 12.016/09).

Este é o voto.

Gabinete Desembargador Carlos Adilson Silva

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